7 de janeiro de 2010

O Calvinista

Também estou de folga por uns dias. Este post foi originalmente publicado em 03/12/2008, no BJC. Ao texto:

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O calvinista é um ser folclórico. Como um currupira (ou curupira) da teologia, as pessoas inventam estórias, lendas, contos, mitos e fábulas sobre este indivíduo. Os menos desavisados afirmam que eles ensinam a “premonição”. Queriam dizer a predestinação, mas sua cultura bíblica é por demais limitada para citar este nome complicado.

Dizia eu que o predestinacionista é um indivíduo transmutado em mito. Escrevo estas linhas e na cabeça passam situações diversas que exemplificam o caso. Muitos processos perpassam este caminho do desenho da caricatura calvinista. Nem todos são percebidos, e suas variações são muitas, por isso me permito escrever o que anotei quando pensei sobre o assunto, sem a pretensão de esgotá-lo.

Há a desconsideração da identidade como pessoa (e como cristão). O reformado não é mais um ser humano ou um batista ou assembleiano (sim, existem deles na Assembléia de Deus - sou testemunha), ele é apenas O CALVINISTA. Que peso isto terá, depende de como as pessoas enxergarão as doutrinas da graça.

Há também a utilização do rótulo odioso como desqualificador do ser e da mensagem. Aliado ao ponto acima descrito, muitos observam a fala de um calvinista sobre qualquer assunto como algo perigoso, pois o emissor é reformado. O conteúdo é rejeitado a priori, não importando se é verdade ou não, pois vem de uma fonte rotulada como negativa.

A caricaturização do pensamento reformado é elemento comum. A criatividade humana ganha muito peso neste ponto. Calvino é retratado como um assassino malvado. Li apostilas que falam mal dos calvinistas por detestarem as “inocentes criancinhas” ensinando a sua depravação e maldade inerente.

O calvinismo é pintado como a figura de um Deus odioso e tirano forçando pessoas contra a sua vontade a entrarem no céu, enquanto outras que desejavam estar na presença do Pai são rejeitadas porque não foram escolhidas. Convenhamos, eles sabem usar cores fortes e dar uma impressão bem vívida nestas caricaturas. Os calvinistas parecem seres demoníacos e perversos diante de tais pessoas e de quem as ouve.

Nesta caricaturização há os que deliberadamente falsificam o conteúdo do calvinismo para se fazerem de bonzinhos. Estes não estão preocupados com a verdade, mas em ganharem o debate, por isto farão o que for necessário. Existem os que simplesmente desconhecem o assunto, e assim repetem o que ouviram de alguém, como papagaios treinados.

Item a ser acrescentado é a restrição do calvinismo à doutrina da predestinação. A predestinação faz parte do calvinismo, mas ela é um pequeno elemento do sistema maior, ou cosmovisão, como chamam alguns. Limitar o calvinismo à predestinação é colocar uma mordaça sobre ele, para que sua mensagem seja limitada ao lugar comum.

Ninguém precisa de estratégias malvadas para combater uma idéia (os comunistas e arminianos deviam se esforçar pra me ajudar neste ponto). Se se está defendendo a verdade, por que não apresentá-la com vigor, a fim de destruir a mentira? Se os calvinistas estão errados, por que não simplesmente conversar sobre o assunto apresentando a perspectiva oposta de maneira que destrua os seus argumentos?

Enquanto isso, os teólogos-currupiras, os unicórnios da fé permanecem por aí, nas florestas das igrejas, capturando as mentes das pessoas e lavando os seus cérebros.

Allen Porto é blogueiro do A Bíblia, o Jornal e a Caneta, e escreve no 5 calvinistas às quintas-feiras.

Um comentário:

  1. Tenho observado que a descrição estereotipada do calvinista, descrita neste texto e também na obra O Calvinismo de Abraham Kuyper, tem similaridades com o discurso anti-semita contra judeus. Os judeus foram acusados de matar crianças para usar o sangue na ceia de Pêsach (Páscoa), o chamado libelo de sangue. A acusação de conspiradores alimentou a ideologia do Partido Nacional Socialista. Muitas acusações presentes no discurso anti-calvinista estão também presentes no discurso anti-semita. Curiosamente, Calvino foi rotulado de "judaizante" (por luteranos e anabatistas), por causa do princípio de "teonomia" presente em suas Institutas e a tendência de suas construções teológicas sempre partirem de um relativo filosemitismo. Impressionante!

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