7 de junho de 2011

Depravação: total, antiga e profunda

O Senhor viu que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e que toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal. (Gn 6:5)
O texto bíblico apresenta o triste diagnóstico da humanidade nos dias de Noé. O pecado havia tomado proporções tais que “o Senhor arrependeu-se de ter feito o homem sobre a terra; e isso cortou-lhe o coração” (Gn 6:6). A iniquidade se multiplicara grandemente. Porém, a maldade manifesta nada mais era que a consequência de algo que estava no íntimo de cada indivíduo, a depravação total, a qual afeta a todos os descendente de Adão. Do verso em destaque podemos aprender que:

A depravação humana é antiga, tanto historicamente quanto na experiência individual. Gênesis é o primeiro livro da Bíblia e apresenta os primórdios da humanidade. E nessa época já descrevia a situação do homem como sendo afetada drasticamente pelo pecado. Outro livro, talvez mais antigo que Gênesis avalia o homem dizendo “que é impuro e corrupto, e que bebe iniqüidade como água” (Jó 15:16). Desde que nossos primeiros pais pecaram, nossa natureza foi corrompida e sempre nos inclinamos para o que é contrário à vontade de Deus. Na história individual, não é diferente. A depravação se manifesta precocemente: “o seu coração é inteiramente inclinado para o mal desde a infância” (Gn 8:21). O que Davi diz do ímpio pode ser dito dos homens em geral: “erram o caminho desde o ventre; desviam-se os mentirosos desde que nascem” (Sl 58:3).

A depravação humana é total. A totalidade da depravação é explicitada pelos termos “toda” e “sempre” e “somente”. Sempre refere-se ao tempo, o homem pensa o mal o dia todo.Todo inclui todos os desígnios de seu coração como sendo maus. E somente exclui qualquer capacidade de que ele outra coisa senão pecar. Depois de passar em revista todos os homens, Deus conclui que “todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer” (Sl 14:3). Nenhum filho de Adão escapa dessa avaliação negativa, Paulo demonstra “que tanto judeus quanto gentios estão debaixo do pecado” (Rm 3:9).

A depravação humana é profunda. O texto descreve a maldade dos contemporâneos de Noé como incluindo casamentos mistos e violência. Mas isso era a ponta do iceberg. A depravação lança suas raízes no mais íntimo das pessoas. Os pensamentos de seu coração é que eram maus e determinavam o comportamento iníquo. O coração representa a essência do homem e dele é que procedem as atitudes e comportamento humanos. O problema consiste em que “o coração é mais enganoso que qualquer outra coisa e sua doença é incurável” (Jr 17:9) e é dele que “saem os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, as imoralidades sexuais, os roubos, os falsos testemunhos e as calúnias” (Mt 15:19). Sendo o coração a sede da depravação, todas as faculdades do homem são por ela afetadas, de modo que nenhum aspecto da natureza humana foge da corrupção que a assola.

Sendo afeta a todos os homens, de todos os tempos e idades, a depravação torna o evangelho necessário, pois somente ele “é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê: primeiro do judeu, depois do grego” (Rm 1:16). Uma reforma exterior ou uma mudança de atitude é ineficaz, além de impossível. “Será que o etíope pode mudar a sua pele? Ou o leopardo as suas pintas? Assim também vocês são incapazes de fazer o bem, vocês que estão acostumados a praticar o mal” (Jr 13:23). É preciso mais que auto-determinação. É necessária uma transformação que comece no interior, no coração.

Porém, essa mesma depravação que requer um poder atuante para que o homem seja tirado dela é, ela própria, um obstáculo à aceitação do evangelho. Pois a pregação precisa ser ouvida, entendida e recebida no coração. Mas o homem, a priori odeia o conteúdo e rejeita a loucura da pregação. Seus coração está indisposto às coisas espirituais, seu ouvidos surdos para os convites do evangelho, seus olhos cegos para perceber sua triste realidade e suas mãos travadas para que não possa estendê-la a Deus. Estando o homem neste estado, ou Deus faz tudo o necessário para salvá-lo ou ele não se salvará de modo algum.

E é isso que Deus faz. “Darei a vocês um coração novo e porei um espírito novo em vocês” (Ez 36:26) é a promessa feita. Essa renovação do coração é imprescindível, pois “com o coração se crê para justiça, e com a boca se confessa para salvação” (Rm 10:10). Essa renovação do coração também é chamada de novo nascimento e “ninguém pode ver o Reino de Deus, se não nascer de novo” (Jo 3:3). Mas o novo nascimento é operado exclusivamente por Deus, sem o concurso da vontade humana, pois os nascidos de novo “não nasceram por descendência natural, nem pela vontade da carne nem pela vontade de algum homem, mas nasceram de Deus” (Jo 1:13).

Temos assim que a depravação é total por abranger todas as faculdades, de pessoas e em todas as épocas. Sua sede está no coração do homem e por isso ele é incompletamente incapaz de se livrar dela e fazer o bem aceitável diante de Deus. O único remédio para o homem é nascer de novo e isto somente é possível pelo poder de Deus, cuja operação é pela graça e antecede qualquer ato da vontade humana. Assim, toda glória pela transformação de um depravado num santo é devida unicamente a Deus!

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.

8 comentários:

  1. Clóvis,

    Você como um calvinista talvez possa esclarecer algumas coisas que me inquietam sobre essa teologia.

    quando vc diz que você é calvinista isso quer dizer o que exatamente:

    Você crê no batismo infantil (discordando de Spurgeon...)?

    Você está no lado de Stott ou de Lloyd-jones no que diz respeito ao batismo com o Espírito Santo?
    Você é supralapsariano ou infralapsariano?

    Você é complementarista ou igualitarista? (papel da mulher...)

    Você é amilenista ou tem outra posição escatológica?

    Você crê que Deus ama todo pecador que ouve o evangelho e nesse amor deseja a salvação de todo o pecador como defendido por Spurgeon e Ian Murray ou está do ao lado de David Engelsma em criticá-los duramente por essa posição?
    http://www.monergismo.com/textos/calvinismo/Hiper-Spurgeon_Engelsma.pdf

    Você é cessacionista ou crê na atualidade dos dons?

    Você, como alguns calvinistas radicais, considera os não-calvinistas como hereges? Ou tem algum desprezo por eles? Ou sente aversão a quem se opõem a alguns conceitos calvinistas?

    Você é determinista (mesmo não sendo fatalista)? Você acredita que a sua oração serve para que??

    Você realmente acredita que existe uma total correspondência entre calvinismo e evangelho?? Se não, então pode haver alguns erros no calvinismo... não é??

    Você não acha estranho toda essa exaltação (para mim quase veneração) que os seguidores de Calvino prestam a ele?

    Resumindo, o que é calvinismo afinal de contas... tirando o TULIP para mim parece que só sobra discordância entre os calvinistas.

    abs.

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  2. Na questão quanto a ser a depravação humana total, a menção a Sl 14:3, indicando que a totalidade dos homens, ou seja, a humanidade inteira, é atingida pela referida depravação parece ser contradita pelo texto logo abaixo daquele que inicia esse post, a saber, Gn 6:8.
    Se, como dito em Sl 14:3, “todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer”, como, então, "Noé... achou graça aos olhos do Senhor"? E, na prática, não somente ele, mas sua mulher, seus filhos e as mulheres de seus filhos, visto que a todos o Senhor poupou.
    Como conciliar essas passagens?

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  3. Amado Luciano, visto que a sua compreessão foi certa, porém, queres fazer confusão a um texto bem formulado.
    Contudo, não é díficil entender a palavra "todos" ou "nínguém", fica a seu critério. Mas, quanto a Noé ele foi apenas mais um mero escolhido de Deus assim como Paulo, que executava tantas perseguições contra eleitos e um dia veio a ser o perseguido, para executar seus planos Deus não necessita de bons ou maus,nínguém ou alguém, nenhum ou todos,apenas de Si próprio, visto assim que tudo depende da vontade Dele, e não de vontade humana.
    A graça e a Paz.

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  4. Luciano,

    Obrigado por seu comentário. Você disse que Sl 14:3 "parece ser contradita pelo texto logo abaixo daquele que inicia esse post, a saber, Gn 6:8". Pelo que entendi, você crê que “todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer” está em contradição com "Noé... achou graça aos olhos do Senhor".

    Não é o caso. A leitura atenta da passagem demonstra que Deus foi gracioso com Noé. O contraste não é entre homens depravados e homens santos (Noé e seus filhos), mas entre homens que seriam destruídos e homens que seriam poupados. E o que os distinguia era a graça de Deus.

    O verso 7 diz "Disse o Senhor: Farei desaparecer da face da terra o homem que criei..." e no verso 8, "A Noé, porém, o Senhor mostrou benevolência" (NVI).

    Ou seja, o texto mostra a graça de Deus para com o pecador Noé como a razão dele ser poupado.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  5. André,

    Não entendi muito bem o propósito dos seus questionamentos. Está interessado nas minhas convicções pessoais ou no calvinismo como visão de mundo?

    Se lhe interessa de fato saber o que creio, veja minha declaração de fé. Resumidamente, sou credobatista, pentecostal, complementarista, premilenista histórico, creio que o arminianos são irmãos em Cristo mas que pelagianos e neoteístas são hereges, não creio que o calvinismo é o evangelho, mas que é a melhor interpretação do evangelho e não venero mas admiro Calvino e outros reformadores, além dos puritanos.

    Se você navegar pelo meu blog, especialmente lendo os textos de minha autoria, poderá aprender mais sobre o que eu creio, se isto de fato lhe interessa.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  6. Clóvis,
    esclarecida a questão. Realmente talvez eu não tenha meditado no contexto adequadamente ao vislumbrar uma contradição entre textos.
    Muito obrigado por sua atenção e pela delicadeza do trato com meu questionamento.
    Quanto ao questionário do André, Clóvis, suspeito que ele não vai procurar saber no que você acredita de fato. Não pareceu ser essa a intenção dele.

    Adelson Couto,
    seus primeiros dois parágrafos não eram necessários, primeiro porque eu não quis, como você deduziu, fazer confusão a um texto bíblico, e segundo, porque dizer que o significado de algo que se está questionando fica a critério do questionador é evasivo e não ajuda este que está buscando crescer no conhecimento (e na Graça, mas essa é com o Senhor) com a ajuda de irmãos mais esclarecidos. De qualquer forma, obrigado pelo esclarecimento, que, com outras palavras, foi o mesmo do Clóvis, mas sem a mesma delicadeza.

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  7. rsrsrs
    Tem comentário que é mesmo uma comédia!
    Duvido, pelo tom geral, que as intenções do André sejam boas. Mas também não posso ser categórico.
    De qualquer forma, ele erra mais ainda do que parece. Nem todos os calvinistas concordam com a TULIP, por exemplo. O mote dele, no entanto, parece ser que, por conta das discordâncias internas entre calvinistas, o calvinismo não pode ter uma identidade, não pode ser. Se este é mesmo o mote, então o comentário é mesmo uma grande piada sem sentido.
    Pois não há linha de pensamento humano sem variações. Não há unidade total e absoluta entre arminianos, entre católicos, entre racionalistas, entre empiristas, entre analíticos, entre ateus ou entre quaisquer no mínimo dois que se afirmem um único algo qualquer.
    Enfim, para uma tal bobagem, a não ser que se provem melhores intenções e raciocínio, é rir ou ter pena. Ou ambos.
    A Deus a glória!
    Roberto

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  8. Luciano, peço desculpas, mas é que ao parecer do texto estaria mal intencionado.
    Depois da última postagem, observei que não.
    E peço desculpas novamente.Pois, o desejar aqui é que todas venham a ser amigos.

    A Graça e a Paz

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