27 de maio de 2010

Minha bronca com os “tolerantes”

É impressionante como a palavra “calvinista” (ou “calvinismo”) causa asco nas pessoas. Muita gente não quer nem ouvir falar em calvinismo, muito menos nos calvinistas. Motivo? Bem, dizem que somos muito intolerantes. Tanto crentes quanto incrédulos pensam basicamente a mesma coisa a respeito de nós, embora que por ângulos um pouco diferentes. Os não-crentes nos perguntam se somos adeptos daquele “tirano capitalista” de Genebra; os que se dizem cristãos nos perguntam se cremos mesmo naquele “Deus tirano” de Calvino. Ou seja, onde quer que um calvinista esteja ele sempre será alvo do doce vilipêndio dos “tolerantes”. Não é interessante isso?

Mas os calvinistas tem culpa no cartório, sim. São eles que sempre “estragam” as conversas sobre religião. Tudo vai bem até o calvinista dizer que Deus é soberano, que nenhuma folha cai no chão se não for pela ordem divina e coisas afins para que o clima fique tenso. E o intolerante na história sempre será o calvinista, é claro!

Fico me perguntando quando é que essa hipocrisia vai acabar, se é que um dia vai acabar. Os “tolerantes” não suportam um confronto sério com a Verdade, e ainda ficam dando uma de vítima da situação, dizendo que os intransigentes somos nós. Peço a Deus que me livre de ser tolerante para com o erro daqueles que não acatam e aceitam Sua Verdade, mas que Ele igualmente me dê o discernimento necessário para saber onde devo ser flexível – combater as ideias, não as pessoas!

Soli Deo Gloria!

26 de maio de 2010

O Estado também peca

Talvez uma das lições bíblicas aprendidas mais tardiamente pelos cristãos seja a da separação entre a Igreja e o Estado. Se no Antigo Testamento, o sustento do culto era uma responsabilidade real, a ponto de reis terem fechado o templo de Jerusalém movidos por seus caprichos idólatras, no Novo, em momento algum, Jesus promete a instalação de um reino temporal cristão. Ao contrário, Ele ensina que, agora, o seu reino não é deste mundo:
Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui. (João 18:36)
O Senhor nunca exigiu que o Império Romano protegesse ou divulgasse a fé cristã ou que os cristãos devessem organizar um levante popular para derrubar o imperador. Desta maneira, a separação institucional entre Igreja e Estado pode sim ser considerada uma doutrina bíblica.

No entanto, separação não significa, em absoluto, que o Estado não tenha responsabilidades diante de Deus. Os diferentes governos não são entidades autônomas, fora da lei de Deus e de seu domínio, entes que seguem uma moralidade à parte daquela estabelecida na Bíblia. Dito de modo mais claro, os Estados podem pecar, apesar da separação entre eles e a Igreja.

Ministros de Deus
Isso acontece porque Deus é o Senhor de todas as coisas, de tudo o que diz respeito à existência humana, inclusive da política. Como dizia o teólogo holandês Abraham Kuyper:
não há um milímetro cúbico em todas as áreas da existência humana sobre o qual Cristo, que é Soberano acima de todos, não possa dizer "É meu!"
Por isso, a Bíblia apresenta os agentes estatais como sendo ministros de Deus, pessoas que receberam autoridade divina e possuem certos direitos...e deveres no exercício do poder:
Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas. De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos condenação. Porque os magistrados não são para temor, quando se faz o bem, e sim quando se faz o mal. Queres tu não temer a autoridade? Faze o bem e terás louvor dela, visto que a autoridade é ministro de Deus para teu bem. Entretanto, se fizeres o mal, teme; porque não é sem motivo que ela traz a espada; pois é ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal. É necessário que lhe estejais sujeitos, não somente por causa do temor da punição, mas também por dever de consciência. Por esse motivo, também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo, constantemente, a este serviço. Pagai a todos o que lhes é devido: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto; a quem respeito, respeito; a quem honra, honra. (Romanos 13:1-7)
Aqui, aprendemos:

1) Que a verdadeira fonte primária do poder estatal é Deus, e não o povo (democracias) ou as armas (ditaduras);
2) Que as autoridades são ministros de Deus;
3) Que o dever básico do Estado é premiar quem faz o bem (faze o bem e terás louvor dela) e punir quem faz o mal (ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal);
4) Que o Estado tem o direito de receber tributos, submissão de seus cidadãos, respeito e honra.

Quando um cristão se recusa a pagar impostos ou desobedece às leis do Estado, ele peca, por não cumprir com suas obrigações diante de uma autoridade divina. Por outro lado, quando o Estado não cumpre com o seu papel de premiar quem faz o bem e punir quem faz o mal, ele também peca, por desobedecer ao papel que lhe foi dado por Deus. E, se há pecado, também há castigo.

A condenação bíblica dos governos
Uma forma de quebrar o mandamento divino é usar a máquina estatal para pelejar contra Deus. Em Apocalipse 17, esse caso é retratado de modo dramático e em cores escatológicas, quando se fala da condenação dos reis que seguem a besta (de certa forma, um símbolo de Satanás):
Os dez chifres que viste são dez reis, os quais ainda não receberam reino, mas recebem autoridade como reis, com a besta, durante uma hora. Têm estes um só pensamento e oferecem à besta o poder e a autoridade que possuem. Pelejarão eles contra o Cordeiro, e o Cordeiro os vencerá, pois é o Senhor dos senhores e o Rei dos reis; vencerão também os chamados, eleitos e fiéis que se acham com ele. (Apocalipse 17:12-14)
Nos últimos dias, todos os governos da Terra usarão sua estrutura, inclusive a militar, para guerrear contra Cristo e sua Igreja. Contudo, essa guerra já começou. Todas as vezes que um governo restringe a liberdade dos cristãos e os persegue, ele faz guerra contra o Cordeiro. Quando um governo adota padrões contrários aos adotados por Cristo, defende uma moralidade diferente da preconizada por Deus ou obriga seus cidadãos a pecarem, eles estão pelejando contra Cristo e atraindo sobre si a pena de destruição. Lutar contra a Igreja é lutar contra os que fazem o bem.

O Antigo Testamento traz ainda mais condenações. Quando são decretadas leis injustas, que aviltam a verdadeira justiça e aumentam a opressão na sociedade, os governos também são condenados e o juízo divino está às portas:
Quando as leis existem, mas a corrupção grassa no governo, o Estado também peca:
Assim diz o SENHOR: Por três transgressões de Israel e por quatro, não sustarei o castigo, porque os juízes vendem o justo por dinheiro e condenam o necessitado por causa de um par de sandálias. (Amós 2:6)
E o que os cristãos devem fazer quando o Estado incorre nestes pecados?

O dever dos cristãos

A segunda coisa é interceder. Uma vida tranqüila e um governo piedoso dependem das orações dos cristãos:
Antes de tudo, pois, exorto que se use a prática de súplicas, orações, intercessões, ações de graças, em favor de todos os homens, em favor dos reis e de todos os que se acham investidos de autoridade, para que vivamos vida tranqüila e mansa, com toda piedade e respeito. (1 Timóteo 2:1-2)
A terceira coisa é atuar dentro das regras políticas para fazer com que o Estado cumpra o seu papel. José no Egito, Ester e Mordecai na Pérsia e Daniel, na Babilônia e na Pérsia, são exemplos de como isso pode ser feito por cristãos que são chamados para serem ministros, juízes ou outras funções públicas.

Por fim, a Igreja pode exercer o seu papel profético e denunciar os abusos e erros das autoridades e as deformidades do Estado. Os textos proféticos citados aqui são uma pequena amostra da ampla base bíblica existente para que cristãos denunciem esses pecados, preguem e protestem, até mesmo usando palavras fortes.

Quando vivemos em um país chamar de amigas nações que perseguem o Evangelho, onde deputados são condenados por crimes que já prescreveram, onde medidas protelatórias podem fazer julgamentos acontecerem 20 anos depois da ocorrência dos crimes, onde movimentos criminosos como o MST são reconhecidos como legítimos pelo Governo Federal e a corrupção desvia recursos que deveriam ser empregados para a promoção do bem-estar dos bons...a apatia dos cristãos diante de tudo isso é escandalosa.

Não é papel do Estado evangelizar, subvencionar cultos, promover a disciplina eclesiástica ou doar terrenos e conceder isenções às igrejas, assim como não cabe a estas últimas a tarefa de legislar ou de usar a máquina estatal para divulgar o cristianismo. Todavia, a separação entre Igreja e Estado não é desculpa para nos calarmos diante dos pecados do Estado. Que os cristãos ergam a sua voz!

Não usei neste texto uma definição extremamente exata ou rigorosa dos termos Estado e Governo.

Helder Nozima é pastor presbiteriano e blogueiro do Reforma e Carisma.

24 de maio de 2010

Aos que não entendem os calvinistas

Uma querida e perplexa irmã comentou "a minha maior dificuldade com o calvinismo é entender por que eles não fazem nada, não se privam de nada, e criticam todos aqueles que estão 'correndo atrás' da salvação por crerem que tal é tomada por esforço. Bem, entendo melhor o calvinismo, mas me sinto mal, pois sempre acho que fiz pouco...". O que mais poderia responder a ela, além do que se segue?

A sua dificuldade, amada, não é com o calvinismo, mas com a graça. Sua rejeição ao calvinismo se deve à sua rejeição à graça como o modo de Deus salvar pecadores perdidos. Se você entendesse e aceitasse a doutrina da graça, como ensinada nas Escrituras, as dificuldades com o calvinismo se evaporariam.

Veja bem, você (permita-me a intimidade) disse que não entende por que os calvinistas não fazem nada, nem se privam de nada para obterem à salvação. À luz da graça, há duas razões para isso. A primeira, é que é desnecessário. Tudo o que era preciso ser feito para nos salvar, Deus já o fez. Uma vida de perfeita obediência era necessária? Jesus a viveu por nós. Uma morte que apresentasse pela satisfação à justiça de Deus precisava acontecer? Jesus a morreu por nós. Uma ressurreição vitoriosa que assegurasse nossa própria ressurreição era preciso? Jesus levantou-se dentre os mortos - e nós com Ele.

O segundo motivo por que os calvinistas desistiram de qualquer esforço para granjear a salvação (pois na verdade, muitos deles se esforçaram à exaustão antes de entregarem os pontos) é que todo esforço é inútil. Ninguém consegue obter o favor de Deus impressionando-o com boas obras, com ascetismo, legalismo ou qualquer outra coisa feita a título de "correr atrás". O evangelho diz "não depende de quem corre, mas de Deus usar misericórdia".

Anulado todo esforço humano, só resta a graça, de modo que se alguém não for salvo absolutamente de graça, não o será de nenhuma outra forma. E graça e esforço próprio são auto-excludentes. Paulo diz que "àquele que faz qualquer obra não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida". Ou seja, você pode "correr atrás" e ser salvo pela graça ao mesmo tempo. É uma coisa ou outra, mas só uma delas funciona.

Então é perfeitamente compreensível que você "corra tanto atrás", "se prive" de tantas coisas, "se esforce" ao máximo e mesmo assim "se sinta mal" por fazer tão pouco. Pois nunca será o bastante. Você jamais conseguirá reunir crédito suficiente para dar uma espiadela no céu, muito menos para por um pé lá. Ou você se deixa levar pela graça de Deus, desistindo de seu esforço próprio, ou este esforço te arremeterá com mais força no inferno.

Não confunda, porém, graça com libertinagem. "Pecaremos para que a graça abunde?", perguntaram ao apóstolo da graça. Sua resposta é um grito "de jeito nenhum! nós que estamos mortos para o pecado, como viveremos ainda nele?". As obras do crente, são obras de gratidão. Não para alcançar a salvação, mas por te-la alcançado. Não por medo de perde-la, mas por amor ao que a garante. Não para evitar o inferno, mas porque estamos a caminho do céu.

Que o Senhor possa levá-la a descansar na Sua graça!

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.

19 de maio de 2010

Culpados!

Mas agora, sem lei, se manifestou a justiça de Deus testemunhada pela lei e pelos profetas; justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos e sobre todos os que crêem, porque não há distinção, pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tolerância, deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; tendo em vista a manifestação da sua justiça no tempo presente, para ele mesmo ser justo e o justificador daquele que tem fé em Jesus. (Romanos 3:21-26)
Qualquer pessoa que acompanhe minimamente o noticiário se sentirá indignada ao menos uma vez todos os dias. O espancamento de um militar que reclamou de barulho às 3 da manhã e foi agredido covardemente por seis homens; os ataques feitos por homens armados com facas em escolas chinesas ou os freqüentes casos de corrupção despertam o nosso senso de justiça. Quando estes crimes ficam impunes, a sociedade se sente frustrada e cresce a sensação de que as pessoas boas só se dão mal.

E nem sempre é preciso que algo grave aconteça para que clamemos por justiça. Uma fechada no trânsito, alguém que grita conosco ou até mesmo o vizinho querendo pregar um quadro na hora do nosso estudo já nos fazem despejar palavrões, maldições e exigirmos que algo horrível aconteça como retribuição àquele absurdo.

Engraçado...temos um senso de justiça tão apurado...mas ele parece desaparecer quando o assunto é pecado. Quando pregamos que toda a humanidade é culpada diante de Deus e que Ele se ira com nossas culpas, tapamos os ouvidos. Nós temos o direito da indignação, Deus só tem o direito de ficar calado e não perturbar o livre exercício de nossa liberdade.

Contudo, Deus não se sujeita aos limites impostos pela humanidade. Se nós queremos justiça, Deus a quer em um grau infinitamente superior. A diferença é que, enquanto muitas vezes nós somos impotentes para punir o erro, Deus com certeza irá punir todo mal cometido no mundo, inclusive aquele cometido por mim e por você.

A justiça de Deus existe
A imagem popular de Deus no Brasil é a de um velhinho bondoso, sentado em um trono muito distante e que perdoa todas as ofensas cometidas contra Ele. A figura do Juiz de vivos e mortos causa repulsa e é automaticamente associada ao fundamentalismo ou a uma visão má de Deus.

Mas, desde quando justiça é maldade? Mal é deixar impunes os erros cometidos. E a Bíblia é clara: Deus é justo. Aquele que peca se torna carente da glória de Deus (Romanos 3:23). Mas, sem a glória divina, também não é possível desfrutar adequadamente do favor de Deus, também conhecido como graça. Na verdade, o pecado quebra a comunhão entre Deus e os seres humanos:
Mas as vossas iniqüidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça. (Isaías 59:2)
Todas as nossas ações têm conseqüências, mesmo as menores. E isso vale para os nossos pecados. Não importa se foi uma mentira (Provérbios 19:9), uma olhada para a mulher do próximo (Mateus 5:28) ou uma ansiedade em relação ao futuro (Mateus 6:25). Essas ações são suficientes para nos separar de Deus.

E, se não houver arrependimento, essa separação será uma realidade eterna:
Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade. (Mateus 7:21-23)
Mas há uma forma de escapar dessa condenação sem ferir a justiça de Deus.

A redenção que há em Cristo Jesus
Em Romanos 3:25, lemos que o sangue de Cristo foi proposto por Deus como propiciação. Essa palavra significa um sacrifício que afasta a ira, o castigo devido por algum pecado. Em outras palavras, Jesus Cristo se ofereceu para morrer no lugar dos pecadores:
Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos, o qual não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca; pois ele, quando ultrajado, não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que julga retamente, carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nos, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados. (1 Pedro 2:21-24)
Nenhum pecado fica impune. A diferença é que uns pagarão integralmente a justa pena por seus pecados, enquanto outros terão sua dívida paga por Jesus. E quem são estes privilegiados? A resposta é: todos os que crêem (Romanos 3:22). Deus é o justificador daquele que tem fé em Jesus (Romanos 3:26).

O que significa exatamente ter fé em Jesus? Em primeiro lugar é reconhecer que Jesus é o Senhor, ou seja, que Ele é Senhor de nossas vidas, o nosso verdadeiro Dono, a quem devemos obediência. Em segundo lugar, é acreditar na verdade da morte e da ressurreição de Cristo Jesus:
Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. (Romanos 10:9)
E essa é uma verdade que vale para todos. Todos, sem exceção, somos culpados aos olhos de Deus. Todos os nossos pecados, sem exceção, são ofensas que ferem o direito de Deus diretamente. Ele é justo em nos condenar.

Mas a boa notícia (esse é o significado de Evangelho) é que nós podemos escapar dessa condenação, se crermos em Jesus Cristo. Por isso, arrependa-se de seus pecados! Deixe Jesus ser o Senhor de sua vida! Creia n'Ele! Esse é o caminho que o levará, no fim dos tempos, ao reino dos céus.

18 de maio de 2010

Aos inconformados com a eleição

Recebi via twitter o seguinte questionamento: "uma amiga minha não se conforma com o fato de sermos salvos por eleição de Deus e não por livre arbitrio nosso. O que vc pode dz pra ela?". Eis o que eu diria:

Em primeiro lugar, que "sermos salvos" (voz passiva) implica que o somos por Deus e não por nós ou algo em nós. Se a salvação é de Deus e não nossa, não deveríamos nos inconformar com o modo como Ele nos salva, mas dar graças a Ele por nos salvar, de um jeito ou de outro. Ou será que existe algo mais importante para nós do que sermos levados à glória ao invés de lançados no inferno?

Diria também que como cristãos temos que nos conformar com o que a Bíblia diz e não com o que pensamos, mesmo que pensemos de acordo com o senso comum. E o que diz a Bíblia? "Vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus" (Ef 2:8). A graça é de Deus, a fé vem de Deus e o livre-arbítrio... bem, o livre-arbítrio não é mencionado aqui. Aliás, em nenhum lugar é mencionado em conexão com a salvação. Para falar a verdade, o livre-arbítrio não é mencionado em lugar algum das Escrituras. Não deveríamos ficar inconformados pela salvação não depender do livre-arbítrio do homem e sim da livre graça de Deus, se acreditamos no que a Bíblia diz.

Em terceiro lugar, não é totalmente preciso dizer que somos salvos pela eleição. A eleição não é nem se equivale à salvação. Ela é para a salvação, que nos é assegurada pela morte de Jesus e aplicada pelo Espírito Santo mediante o ouvir o evangelho. É claro que Jesus morreu para assegurar a salvação dos eleitos e que o Espírito chama irresistivelmente os escolhidos, mas a eleição em si não torna prescindível nem a morte de Jesus, nem a obra do Espírito Santo.

Acrescentaria ainda que deveríamos ficar inconformados se Deus fizesse a salvação depender do livre-arbítrio do homem. Pois neste caso, ninguém se salvaria, mesmo se Jesus tivesse morrido por todos e cada um. Se a eleição de uns implica a reprovação de outros, podemos ter como certa a salvação de parte da humanidade. Como ninguém pode ir a Cristo por si mesmo, caso dependêssemos de nossa própria escolha, teríamos que nos conformar em marchar, toda a humanidade sem exceção de nenhum, a passos firmes para o lago de fogo. Aí está uma coisa com a qual não gostaria de me conformar.

Finalmente, para fechar em cinco pontos (calvinista tem essa mania), temos que considerar que o desígnio da salvação é a glória de Deus e não a nossa concordância com a forma como ela se dá. E Deus é mais e melhor glorificado se a salvação depender somente dEle. Se depender do homem, mesmo que esta dependência seja mínima, mas posto que determinante, a glória de Deus é diminuída. E como servos dEle, devemos nos conformar com que Deus, e somente Ele, seja glorificado pela nossa salvação.

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.

3 de maio de 2010

Ensina-nos a orar

“E ele lhes disse: Quando orardes, dizei: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra, como no céu. Dá-nos cada dia o nosso pão cotidiano; e perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a qualquer que nos deve, e não nos conduzas à tentação, mas livra-nos do mal.” Lc 11:2-4

 

Introdução

“Ensina-nos a orar” foi o pedido feito a Jesus, após ele próprio ter terminado sua oração. Jesus já tinha dado o exemplo, agora ensinaria como faze-lo. Não sabemos quem foi o discípulo que fez o pedido ao Senhor. Provavelmente, não estava presente quando Jesus ensinou a orar em Seu sermão do monte. Talvez tenha sido discípulo de João Batista. Na época, era comum e esperado que os mestres ensinassem seus discípulos a melhor forma de orar. Seja como for, o fato é que o pedido do rapaz, em si mesmo uma bela oração, levou Jesus a repetir a oração modelo, desta vez acrescentando um parábola para ilustrar seu ensino. Dela podemos tirar algumas lições para nossa vida de oração.

Nada a ver com oração respondida

Antes, contudo, convém que notemos o que Jesus não ensinou sobre a oração que Deus ouve. Não disse que a oração mais eficaz é a realizada num lugar específico. Apesar do discípulo vir Jesus “orar num certo lugar”, o meticuloso Lucas não diz que lugar é esse, por ser irrelevante. A eficácia da oração independe do lugar onde é feita, para desapontamento dos que após o culto, ou ao invés dele, correm para orar no monte, como se lá fossem ouvidos de maneira mais atenciosa por Deus. A disputa entre o melhor lugar para orar, se no templo ou no monte, é briga de judeu e samaritano.

A resposta da oração também não depende de quem ora. Pessoas fazem fila para receber a oração de um determinado “homem de Deus”, enquanto menosprezam a oração “do irmão ao seu lado”. É certo que alguns resultados espetaculares da oração de certas pessoas chamam a atenção, mas isso apenas porque não damos a atenção devida ao agir silencioso e discreto de Deus, em resposta a orações de “anônimos”.

Ainda precisa ser dito que o sucesso da oração não depende de uma fórmula. Jesus não pretendeu dar uma fórmula a ser repetida, que automaticamente liberaria o poder dos céus. Tanto é assim que as duas versões da oração ensinada diferem em detalhes. E Jesus, ao orar ao Pai, não a repetia. A oração é um modelo a instruir as nossas orações, apontando para a intimidade e simplicidade com que devemos nos dirigir a Deus.  Os que ensinam fórmulas de oração, atos proféticos ou palavras de determinação estão adotando práticas místicas e pagãs.

Finalmente, a oração eficaz não se baseia nos méritos de quem ora ou por quem se ora. Deus não responde mais a oração de um que tem o viver mais santo do que outro que é mais fraco. Buscar o segredo da oração vitoriosa numa vida exemplar é querer comprar o céu com moedas de cinco centavos enferrujadas. Por isso, são tolos os que jejuam com a finalidade de contranger Deus a ouvi-los.

O segredo da oração ouvida por Deus está, não num determinado lugar, ou em algum intercessor especial, tampouco em fórmulas e méritos, mas na pessoa do próprio Deus. Deus é a fonte de nossas orações respondidas, e o motivo delas o serem. DEle depende uma vida de oração vitoriosa e após termos recebido o que buscávamos, não nos resta nenhum motivo de vanglória, pois tudo foi feito pelo Senhor. Foi isto que Jesus ensinou com a parábola dita após ensinar a oração dominical.

Persistência desavergonhada

Para fixar seu ensino sobre a oração, Jesus conta uma parábola, dizendo “qual de vós terá um amigo, e, se for procurá-lo à meia-noite, e lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, pois que um amigo meu chegou a minha casa, vindo de caminho, e não tenho que apresentar-lhe” (Lc 11:5-6). O vizinho, porém, já estava deitado com toda a sua família e por isso gritou lá de dentro que não poderia atende-lo. “Digo-vos que, ainda que não se levante a dar-lhos, por ser seu amigo, levantar-se-á, todavia, por causa da sua importunação, e lhe dará tudo o que houver mister” (Lc 11:8). Jesus está ensinando pelo contraste, não está dizendo que o Pai atende à porta de má vontade, quando nós o incomodamos até vencê-lo no cansaço. Se a oração perseverante produz efeito em alguém, é em nós. A verdade que Jesus está ensinando é que se um homem egoísta e de má vontade atende um vizinho necessitado, quanto mais nosso Pai responderá nossas orações, haja vista que está sempre disposto a nos ouvir. Por isso conclui a parábola dizendo “pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á; porque qualquer que pede recebe; e quem busca acha; e a quem bate abrir-se-lhe-á” (Lc 11:9-10).

A palavra-chave da parábola, creio, é “importunação”, no grego anaideia, e que só ocorre aqui no Novo Testamento. Embora as nossas traduções tragam “importunação”, “incômodo”, “amolação” ou “audácia”, o sentido etimológico (a=“sem” + aidos=“pudor”) é desavergonhado, sem vergonha. Não devemos nos envergonhar de pedir em oração, mesmo não sendo quem devíamos ser, mesmo não orando como devíamos orar e mesmo não merecendo o que pedimos, pois tudo o que recebemos é por pura misericórdia, baseado no amor e na fidelidade de Deus às suas promessas. Um exemplo disso é a mulher siro-fenícia, que quando Jesus lhe disse que não era apropriado dar o pão dos filhos aos cachorrinhos, ao invés de envergonhar-se ou ficar ofendida disse que até cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa. E recebeu a bênção pedida, acompanhada de um elogio de Jesus à sua fé!

Confiança na bondade do Pai

Completando sua resposta ao discípulo Jesus diz “e qual o pai de entre vós que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, também, se lhe pedir peixe, lhe dará por peixe uma serpente? Ou, também, se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião?” (Lc 11:11-12). Aqui, o contraste implícito na parábola é declarado e acentuado. A certeza da oração respondida baseia-se no caráter amoroso de nosso Deus. “Pois se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles que lho pedirem?”. Mesmo os pais aqui da terra, universalmente corrompidos pelo pecado, atendem aos pedidos de seus filhos. Muito mais Deus, sendo bom e fonte de toda bondade, inclusive as demonstradas por homens maus, atenderá o pedido de seus filhos.

Conclusão

Devido ao fato de nossas orações serem ouvidas por um Pai amoroso e que se deleita em nos abençoar, não devemos nos iludir que tudo o que pedirmos nos será dado pelo Pai, exatamente como o pedimos. Pois não sabemos pedir como convém. Deus é um Pai que não dá um escorpião quando o filho lhe pede um ovo, mas também não dá um escorpião quando o filho pede um escorpião, nem uma serpente quando o filho pede uma serpente venenosa. Tudo o que recebemos de Deus é por Sua misericórdia, e tudo o que não recebemos dEle é por misericórdia dobrada. Glorifiquemos a Deus pelo que nos dá, mas não nos esqueçamos de agradecer por aquilo que pedimos e nos é negado.

Porém, um pedido é sempre certeiro. “Quanto mais dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles que lho pedirem?” dá a dica do melhor a ser buscado. Pois tendo o Espírito Santo, oraremos melhor, pois Ele geme com gemidos inexprimíveis, intercedendo por nós. Ele guiará nossos pensamentos àquilo que é mais proveitoso para nós e necessário para a igreja. Ele mudará a nossa perspectiva, inverterá a nossa escala natural de valores, nos fazendo ver que na simples oração modelo temos tudo o que precisamos para resolver nosso passado, viver em contentamento nosso presente e sermos guardados no futuro, até a volta de Jesus.

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.