Pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, mas sim alguém que, como nós, passou por todo tipo de tentação, porém, sem pecado. Hb 4:15
Os cristãos concordam que Jesus não pecou. Somente Ele podia dizer “qual de vocês pode me acusar de algum pecado?” (Jo 8:46) e calar a audiência. Mas a questão que permanece é “Jesus poderia ter pecado?”.
Em outras palavras, Jesus era incapaz de pecar ou apenas capaz de não
pecar? E no centro dessa discussão está a passagem em apreço.
O ponto em disputa depende da expressão “sem pecado”.
Se pecado é visto como o resultado, então é possível supor a
possibilidade de sucumbir a tentação. Porém, se pecado é entendido como
natureza pecaminosa, então Jesus não possuía uma natureza pecaminosa, e
portanto não era propenso a pecar.
Os
que defendem a pecabilidade (não o fato, mas a possibilidade de ter
pecado) alegam que se Jesus não poderia pecar, não poderia ser
verdadeiramente humano, que se Ele não podia pecar então sua tentação
não foi real e, finalmente, que se Ele não podia pecar, logo não possuía
livre-arbítrio. Examinemos esses argumentos.
É verdade que desde Adão todos os homens pecam.
Porém, o pecado não faz parte da constituição original do homem, sendo
assim, não é essencial que se tenha uma natureza pecaminosa para que se
seja humano de fato. A natureza humana de Jesus era a mesma de Adão
antes da Queda, portando, não corrompida pelo pecado. Jesus veio “à semelhança do homem pecador, como oferta pelo pecado” (Rm 8:3), mas essa semelhança não significou que Ele tivesse pecado, pois “Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (1Co 5:21).
Devemos considerar também que Jesus foi gerado pelo Espírito Santo,
que milagrosamente impediu que a natureza caída de Maria fosse
comunicada a Ele. O anjo diz como seria a concepção do Filho de Deus: "O
Espírito Santo virá sobre você, e o poder do Altíssimo a cobrirá com a
sua sombra. Assim, aquele que há de nascer será chamado santo, Filho de
Deus” (Lc 1:35) e de fato, pouco depois, Maria “achou-se grávida pelo Espírito Santo”
(Mt 1:18). Finalmente, ao argumento de que a pecabilidade é inerente à
natureza humana deve ser respondido com o fato de que a impecabilidade é
inerente à natureza divina. Como Deus não pode pecar, sendo Deus Jesus
tampouco poderia.
Mesmo incapaz de pecar, Jesus podia e o foi tentado de uma forma real.
Tentabilidade não implica susceptibilidade ao pecado. Um exército
invencível pode ser atacado. Uma fortaleza inexpugnável pode receber
investida de conquistadores. O fato de Jesus não ser capaz de pecar não
diz nada sobre a disposição do Diabo de tentá-lo. Se no céu ele ousou se
rebelar contra o Altíssimo, quanto mais ele o faria contra o Filho do
Homem na terra, muito embora nem lá, nem aqui, tivesse chance de lograr
êxito. Mas, há que se destacar um ponto. Nem tudo o que se aplica a nós,
em termos de tentação, se aplica a Jesus. Somos tentados a partir de
dentro, “pois
do interior do coração dos homens vêm os maus pensamentos, as
imoralidades sexuais, os roubos, os homicídios, os adultérios” (Mc 7:21). Como Jesus não tinha um “coração perverso e incrédulo” (Hb 3:12), portanto, todas as suas tentações tinham origem externa e não em desejos maus e proibidos.
Finalmente, argumenta-se que se Jesus não podia pecar, então Ele não tinha livre-arbítrio.
Não vamos aqui refutar a bobagem que chamam de livre-arbítrio do homem,
apenas presumamos que Jesus tinha livre-arbítrio e vejamos se este fato
seria incompatível com a doutrina da impecabilidade. O livre-arbítrio
corretamente entendido é a faculdade de decidir livremente, de acordo
com a própria natureza. Em Jesus, havia duas naturezas, a humana e a
divina. Pela natureza humana, Jesus podia não pecar, pois Sua natureza
não estava corrompida pelo pecado e em tese, poderia pecar. Porém,
através da natureza divina, Ele não podia pecar, pois isso iria contra a
própria natureza. Sendo assim, podemos dizer que o Senhor tinha um
livre-arbítrio perfeito, que o capacitava a livremente fazer sempre e
unicamente a vontade de Deus.
Soli Deo Gloria
Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.
Clóvis,
ResponderExcluirquem defende a possibilidade de pecado em Jesus é Charles Hodge e, se não me engano, G. C. Berkower. Discordo dos tais. Para mim, do mesmo jeito que Adão não poderia não pecar, Jesus não poderia fazê-lo. É nessa polaridade que vou.
Parabéns pelo artigo. Ficou muito bom!
Abraços!